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Amélia e Capitu - Mulheres na Comunicação

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Amélia e Capitu

Desde pequena
Disseram para ela ser
Amélia
E ela foi…
Capitu

(Zach Magiezi)

 

Por mais desconstruído e sensível que o homem branco se pretenda, sua narrativa sobre mulheres sempre há de ser atravessada pelo machismo e romantização que acaba por fetichizar uma mulher ideal.

Antagonizar Amelia e Capitu é tentador e pode parecer, a princípio, um enaltecimento da figura desta em detrimento daquela. O que já é um desserviço por si só, uma vez que o que sabemos são duas figuras construídas segundo o olhar masculino de seus pares – visões implicadas e comprometidas, portanto (vale lembrar que essa imagem comprometida de Capitu era precisamente a intenção magistral de Machado de Assis).

Entretanto, um olhar mais cuidadoso nos revela que antagonizar Amélia e Capitu é, na verdade, reforçar uma visão de Capitu como o ideal de mulher – maliciosa, manipuladora, furtiva, cigana, oblíqua, dissimulada… E problema nenhum em sê-lo; entretanto, essa é uma Capitu que Bentinho construiu pra si, uma Capitu que fazia sentido pra ele, uma Capitu que se encaixava nos delírios de menino inseguro e sempre desconfiado.

É assim que não se pode comprar uma imagem de Capitu construída por uma masculinidade frágil e doentia. De repente, Capitu era só Capitu mesmo. Verdade seja dita: não podemos dizer quem foi Capitu, pois tudo o que temos desse personagem ficcional é o olhar prejudicado de um Bentinho paranóico. E a razão é precisamente essa.

No meio dessa reflexão, me perguntei a razão de “aceitar” a figura de Amélia, mas questionar a de Capitu. Afinal de contas, ambas personagens ficcionais são construídas segundo uma visão masculina.

Cheguei à conclusão de que as características de Amélia são – na música – enaltecidas, aplaudidas, celebradas como ideais, e tanto caracterização quanto enaltecimento são esperados dentro de uma concepção machista desse “ser mulher”. Já as características de Capitu servem de argumento para se colocar em dúvida o amor, as ações, e as intenções da moça, uma vez que, de novo, são interpretadas por um amante ciumento. Ou seja, a abnegação de Amélia, sua modéstia e resiliência são verossímeis porque exaltadas; já dubiedade de Capitu é questionável porque comprometida pelo ciúme de Bentinho.

No fim das contas, nem Amélia, nem Capitu. Nem o desapego celebrativo de uma, nem a falsidade duvidosa de outra.

Exaltemos a coragem de Ifemelu, a astúcia de Kainene e a graciosidade de Olanna, de Chimamanda; miremo-nos na inocência de Ponciá Vivêncio, de Conceição Evaristo e na segurança de Carolina Maria de Jesus, de quem conta a própria história; que nossos exemplos sejam a esperança de Kehinde, de Ana Maria Gonçalves e a afrobrasilidade de Alafiá – contada por Sinara Rubia.

Autora

Gabi Porfírio é graduada em Letras. Especialista em Língua Portuguesa e Mestra em Linguagens. Amante da Análise de Discurso. Militante feminista negra interseccional.

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